Regresso a um passado
Qure não tem regresso
É apenas passado.
Ainda existem sobreviventes
É verdade.
Mas, nem esses testemunham
Que o passado foi um tempo
De rebeldia, de vitalidade
E de bulhas constantes.
Um passado de vida e pujança
De vinho bebido na taberna
De namoros, festas e procissões
E trabalho feito a musculo.
Regresso a um passado
Que futuro há-de ter outro
Talvez amanhã grito
De vidas renovadas
De repouso escondido
E glórias celebradas.
Toda a aldeia é um passado
Que hoje é diferente
E o passado fica longe
Cada vez mais longe
Do sitio para onde hoje
Se faz o presente.
As mentiras que eu escrevo
Fazem alguém acreditar?
Digo que estou triste e fico alegre
Diga que tenho saudades e amores
E é tudo mais uma mentira
Pois, a vida não é poesia
Mas cruel ousadia de viver.
As mentiras que escrevo
Iludem os mais corajosos
Derrotam os aventureiros
E até eu fico convencido
De que sou guerreiro e estrela polar.
Com mentiras me alimento
E esqueço que a mentira
pode ser verdadeira
Quando minto por brincadeira.
E o tempo fez-se escuro e vieram as chuvas
As nuvens e algum frio, nada desagradável
Ainda, antes equinócio de abraços e promessas
De mil ternuras, num beijo ao luar.
Fomos erguendo os nossos corpos ao vento
E todo o momento de saudade chegou até mim
Porque se disse: hoje acabou o verão!
Colho um cheiro no aroma da tarde
Cada ano um novo recomeço
Cada ano uma desigualdade
Um adeus! Folheio o tempo que passa
E numa luz que se dobra em véus
Fico àrvore desencantada e nua
Resistindo ao outono que passa.
Não procuro nada e tudo chega até mim.
(naquela forma leve
que o mar ter de se aproximar
Das pessoas, nos dias de verão
Suave, devagar lambendo-nos os dedos dos pés,
Agitando a cauda,
Como um cachorro de companhia
Ou os esboaçantes cabelos de um amor ausente)
Sigo um caminho que se basta, sem busca
Sem ambição, procurando ser apenas poeira
No turbilhão da tempestade, no vento que mistura
Sal, sentimentos, luzes, mentiras e verdades.
Desisti de procurar, porque o que queria não existe
desisti.
O que queria não era possivel em palavras.
Todos temos no passado os segredos do infinito.
Nos sonhos, a inconsciência do que somos.
Eu não sou todos, ou outro ou alguém
Mais além. Apenas
A ambição de ficar
Não existe,
porque nada fica.
(tudo vai com a vaza mar
Em retorno. Em reversão.
Sem audácia. Apenas
Porque é um costume antigo
Deixar-se engolir pelo mar)
Não procuro nada.
Ouvi um barulho
Algo a estilhaçar-se
Um tombo,
Um chapinhar
Rebentamento
Fui eu
Que disparei
Sim, fui eu
Que parei
Para
respirar!
(No suave momento da vida
Em que se respira e vive
Há dias perfeitos. Sou parte
Dessa implosão.)
o programa, devidamente esculpido
Pelo técnico de serviço
Elaborou o poema, ordenando as palavras
Numa sequência de efeitos
Para um arranho oral e de leitura.
(ou outra coisa qualquer, tanto faz,
Diz-se que é materia criativa, construção
Sintese ou figuração, enfim, poema)
O computador não sabe o que é isso de leitura
Por mais que o seu programador lho explique
Mas sabe adicionar, juntando e disciplinando
As palavras e o seu sequencial previsivel efeito
Na projecção dos arabescos, feitos palavras,
Frases, pequenas virgulas e acentos, riscos,
Traços e elegantes caracteres do alfabeto
(deste ou doutro, consoante a convenção)
São retirados os andaime e descoberta a arte
Presumivelmente bela, erudita e sensivel.
Sem biografia, sem verdade.
O leitor deixa-se enganar pelas emoções.
Afinal é ele, leitor, (todo) o poema!
Encontro-te sempre só.
Quem és tu?
Vejo-te sempre numa luz transparente.
E parecendo ausente, sei que sentes
Que o mundo te abraça e beija
Como nenhum outro mundo faz.
Mas, olhando em volta
Encontro-te sempre só.
Quem és?!
Mulher-pássaro e poeira do mar
Batizo-te na incerteza
Que as flores, de que não sei o nome
Me oferecem beleza e paz
Os dias regressam todos os dias.
Como um eco, uma tempestade
Ou um raio de sol
Na metereologia da sua transparência
Na conflituosidade da sua inocência.
Iguais ou diferentes.
Os dias são:
Banais, tragicos, ousados
Apaixonados, cretinos, amorosos
Feitos do sabor das ondas
De todos os mares e sonhos
E altas montanhas de escarpas
Bicudas com neves e céus
Rochas, lamas, bichos,árvores
Aflições, dores
Os dias têm céus.
(disse, repito, confirmo)
Os dias regressam todos os dias
Porque não se tinham ido embora
Mentem-nos ao esconder-se
Foram ali e já cá estão outra vez
São negaça, trapaça, dia a dia
Flor, guarda-chuva, gira-sol
Os dias estão sempre aqui.
Mesmo quando a noite invisivel
Os adormece.
Levanto os meus braços numa despedida
Sou eu que parto, acenando
Ou são os que ficam que se despedem?
Apenas nos separamos por breves instantes
Todo o adeus é uma saudade
Mas o tempo dos instantes vai passando
E ficamos cada vez mais longe
O longe é afinal uma lei do universo
A ilusão do perto é a ilusão do segredo
Que por não se saber o que é
(por isso é segredo)
Nos faz sonhar que possa ser tudo aquilo
Que queremos que o sonho seja.
A distancia e a separação é tudo
Quanto me resta na memória dos dias
Felizes. O amor é um tempo de guerra
Que morre na paz das inutilidades.
*
Primeiro dia. Hoje cometi uma ilegalidade.(ou terá sido um ilícito?)
Vinte anos depois. A memória persiste em recordar-me coisas do passado. Seria preferível esquecer, mas factos e momentos continuam a assaltar-me a imaginação e a memória. Já nem sei se tudo é verdade ou apenas parcelarmente a verdade existe, sendo a outra parte fruto de delírios febris ou convulsões de quem se desligou do mundo e da realidade.
Claro que me faltam as forças para encarar a vida.
Concluo que “eles” acabaram por chegar e me levaram. Não foi tão mau como imaginava e nem sofri muito. Quiseram-me culpar, como é costume, nos costumes da vida em grupo, mas resisti. O processo foi arquivado. Mal, como é costume, mas o “sistema” funcionou. Tudo se resumiu a acusações, coimas, dividas, juros, ameaças, mais ameaças e tentativas de coação. Injunção e palavras de cassetete. Fiz como alguns isópodes, enrolei-me sobre mim próprio e deixei andar. Como diria o Fernando Pessoa: “não sou nada, nunca serei nada, não posso querer ser nada” por isso…recuso-me a alimentar a voracidade dos esquadrões de advogados, policias, juízes, carcereiros e agentes de solicitação. Sei que sou culpado! Quem o não é?
Continuo a “ ter em mim, todos os sonhos do mundo”.
Agora: prescreveu!
(enxerto de um conto com o titulo "Cul-de-sac"
Drama que incendeia
a lágrima fácil.
Nada como a emoção
Que começa do zero
Começa e acaba.
Lá, onde os afetos
Entrelaçados
Em equivocos
Morrem.
Todos os destroços
São noticia
Especulação
Carpidação.
Tudo segue enxuto.
Abracemo-nos,
Camarada.
Sento-me a ler um livro
É um fim de tarde, já tarde
E tu perguntas-me se estou a descansar.
Sim, estou.
A ler um livro.
(Ler um livro
É descansar.)
Sorriu,
Porque leio livros
Que ainda não foram escritos
São (ainda)
Não-livros
Páginas em branco
Apenas resmas vituais
(sei lá se de papel
Ou outra coisa qualquer)
Sento-me com o objecto que tenho
Em frente, para me ocultar do mundo.
Espreito por de tras das estrelas
E na tolice dos dias vou descobrindo
Que a vida está diferente. Um livro
É um agasalho que me analgesia.
Leio que os livros foram inventados há muito
E quem os leu nada aprendeu
Repousaram os leitores na ilusão do saber
Como pensar que ócio é não pensar
Ou pensar que ler é desistir de aprender
(Ninguém ensina nada a ninguém)
Disse.
A minha avó nunca tinha visto o mar.
Como é que o imaginas? - perguntava-lhe
(eu que desde pequeno vivia junto á agua
Às ondas, ao cheiro e ao sabor dos mares)
- O que pensas quando te falo no mar?
Não sei se a minha avó me respondia
- Já passou tanto tempo -
Mas para mim era um rio largo e grande
Infinito (o que é isso de infinito?)
Onde nadava com amigos da juventude
Uma poça imensa onde Deus
Regava as couves, os nabos, as nabiças
Na sua horta celestial.
Havia milho e farinha e pão...
Claro que era precisa muita água. Afinal
Deus cuidava da humanidade...
A minha avó sorria, penteava os cabelos
E dizia-me: Está bem! Está bem, meu querido!
Foi assim que descobri o mar.
Um dia fui com a minha avó ver o mar
E de nada mais me lembro
A minha avó deixou - subitamente -
De aparecer nas fotografias.
Há sempre uma idade para amar
Com mais força, com amor.
Chegou o mês dos anos e das saudades
Setembro.
Porque foi em Setembro que nasci
E de todas as formas me encontrei
E em mil maneiras morri sem o saber
Em todos os dias no tempo que passa
Banal. A minha vida banal
Mas queria o quê?
Ser heroi, deus eterno como o sol
Louco como a chuva, o frio ou a terra
Que sempre arranjam maneira
De serem mais fortes do que eu?
Queria ser esteiro
Onde meus filhos crescessem
Queria ser primeiro
Onde a luz se tornasse farol
Queria ser
Sentimento e memória
Queria ser
O mar eriçado, violento e cruel
Queria ser
Amor verdadeiro, vento, sal
Diferente...
Mas nada fui
E em tudo me consumi.
(sem gloria nem prazer
Apenas porque é dos actos
gastar-se a vida em aparatos
e coisas mesquinhas)
Setembro.
Uma vez mais em setembro.
Ainda.
Os meus links