E o vento vem em rajadas
Desfazendo tudo.
Todos os dias o vento
Estilhaça as ilusões da noite
Espalha desordem
Que temos que voltar a ordenar
E neste fazer e desfazer
Já antigo
Ficam as nossas vontades
Desmembradas e possiveis.
O vento vem em rajadas
Triturando en lençois
De distancia o seu murro
Que nos empurra
desbarata e estilhaça
Sem pena ou pavor
Porque o vento é apenas a vida
Que recomeça
Depois da agitação do nada.
Escrito na água
em pingos de chuva
Vejo
O teu rosto
Sinto
A tua voz
E vivo
Toda a lembrança.
São os dias
Assim
Que escarpam
Silencios
Esculpem medos
E fazem do fogo
serenas labaredas
De saudade
(existe um fogo
Que a chuva molha
existe um fogo
Que a chuva
Não apaga)
Escrevo
Em frio molhado
Em orvalhos
De luz
Porque o tempo
O tempo
O tempo
O tempo
Não regressa
O tempo
Não é.
Onde anda o amanhã, que ainda não chegou?
Que venha sem pressa, devagar
quero estar aqui
Neste mesmo lugar, hoje, sempre,
quando o amanhã chegar.
porque hoje sou o sempre
Onde habito e inteiro sou
E o amanhã pode ser em qualquer outro lugar
Se eu pudesse ser diferente
Ser outro
Lembrar-me-ia do teu riso
E com esse unico pergaminho
escreveria o teu nome
Em todas as estrelas
Que te viram nascer e morrer.
As estrelas são a minha recordação
O teu nome uma ficção.
(Tenho a casa cheia com o teu retrato
Mas será que exististe
Ou terei amado uma ilusão?)
Se eu pudesse ser diferente
Ser outro
Esqueceria tudo e voltaria a nascer.
Fiz sinal ao autocarro
Que leva passageiros
estendendo a mão.
Este, não parou!
"A ausência é um estar em mim"
Carlos Drumond de Andrade
Não fiquei triste.
Logo apareceu outro autocarro
Que me trouxe até mim
Tudo o que o tempo fizera seu
E nessa nave sem asas voei
Adormeci e me consolei
Na riqueza do que fui
Na alegria do que sou.
Por vezes, tenho sonhos assim!
O céu prenuncia que vai haver chuva.
O tempo arrefece
As almas dos encarcerados ficam nuas
E eu encontro a paz das horas mortas
No teu olhar.
Não precisamos de dizer nada
São esteiros, estas árvores
Que se preparam para o inverno
São folhas e bosquímaros
De que me despeço sem o saber
Num imovel fim de tarde
Num riscado poente de estação
Que não recebe mais viajantes
(vidros foscos, azulejos partidos
Relógo parado e vivalma na caliça
Da gare e dos horarios rasgados
Antigos, abandonados)
Tudo prenuncia anunciando
Que a certeza do que for
Será.
Sempre tudo se faz e transforma
Em outra coisa.
Coisas que na vida acontecem.
Gosto de ver o mundo mudar.
Vou deixar a cidade e partir.
(era para ser ontem, depois
Amanhã, mas hoje é agora)
Não sei para onde vou
Apenas partir e descobrir
O que tiver que descobrir
Porque ao encontro me leva
A paixão pelo renascer.
Descobro romarias de frutas,
E as ondas do mar
Ainda são praia e frescura
No tempo alegre e quente
De um outono tardio.
Vou deixar a cidade
Tenho pressa de chegar
Viajando pelo vento,
Pelo ar
Rumo ao sul empoeirado
Por dentro de uma vinha
Onde o azul de um estio
Feito adobe e montanha
Me espera adormecido
Vou deixar a cidade.
Há um coro de noticias
E em todas se juntam
As pessoas que amamos.
São noticias de nós
São noticias de mim
São palavras, imagens
Pensamentos.
As noticias são alimento
De um passado
Num presente que é hoje
E se quer amanhã
Porque a noticia pode ser
(também ela adivinha)
Futuro.
Chegam noticias de nós
No distante ano
Em que já não existem
Noticias.
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