Chamam os passageiros
Uma voz, num altifalante,
Uma mensagem no electrónico
Estão-nos a chamar:
Entramos no barco, estamos no veleiro,
No vapor, no cruzeiro,
Na amurada, na plataforma,
No cais, na pista de embarque.
No avião.
À porta do automovel
Que nos há-de levar para longe.
Sem remédio, com destino
Com pulso firme,
Simplesmente
Caminhando num rumo que acreditamos
Ter trançado, ser o nosso.
Estamos prestes a sair, a ir
A voar.
Uma e outra vez
(porque voamos, desde que aprendemos
A voar)
Navegamos pairando acima de tudo
Resolvidos a não ficar.
(que outra opção temos?)
O ano está a acabar.
Chegaremos ao destino?
(que destino espera por nós?)
Não me perguntem do que não sei
Sei que irei
E farei do amanhã nova esperanca
Lembrando-me do hoje que ficou
Na poalha luminosa de um dia
Que acaba sem terminar
*areia fina, cristal e diamante*
Porque nada acaba
Antes está tudo - de novo-
A começar.
Não espero por ninguém.
Sigo em frente, como a água,
Por aqui, por ali, por onde der
Ribeira abaixo, por todas as fendas da vida
Onde quer que possa seguir, em correria,
Em pingo, em estagnação,
Procurando oportunidade
Para voltar a seguir em enxurrada.
Não espero por ninguém
E ninguém espera por mim.
Nesta desenfreada loucura,
Nunca nos encontramos
Nunca temos tempo para amar e refletir
Nunca nos encontramos
Nós, tu, eu e eu comigo
Mas,
Por vezes, (às vezes)
Vale a pena esperar!
(Natal de 2019)*
Nota explicativa: Não que alguém ou alguma coisa esteja para chegar, mas porque o caminho faz a espera e todos os dias são dias de nos encontrarmos. (nós e os outros, os outros e nós, pois nunca estamos sozinhos, estamos sempre acompanhados connosco)
Tudo de novo.
Outra vez!
Outra vez!
Tudo de novo
O velho
O antigo
O presente
Outra vez!
Outra vez!
Tudo de novo
Porque é novo
Como nova é a vida
Que se torna nova
Cada dia, cada segundo
Cada momento
Outra vez!
Uma e
Outra vez!
Sempre.
Até que não exista mais
E depois
Tudo de novo.
De novo,
De novo.
Uma última vez!
E então, porque estava frio,
Coloquei as mãos nos bolsos e pensei
Que bom ter bolsos para colocar as mãos!
Era, realmente, quase uma dádiva divina.
Obrigado mãe, pelo casaco, a camisola,
Os bolsos e tudo o mais.
Obrigado por tudo pois tudo te devo
E neste dia que está frio
Agasalho-me melhor
Sentindo-te junto a mim.
Obrigado mãe!
Chove.
E porque é que não havia de chover?
A chuva tem sentires
Que ninguém conhece
E mata o meu desgosto
Por não te sentir
Junto a mim.
No perfume dos dias
No lume da noite
No arrefecer do mar.
Também os meus olhos chovem
No desejo de te encontrar.
Se eu quisesse
escrever um livro
Com todos os meus dias
Com todas as ocorrências
Com todas as incertezas
Loucuras, desejos, aventuras,
Sonhos, tristezas,
Seriam muitas páginas
Um grande fardo
para qualquer leitor
Uma enciclopédia de nadas.
Se eu quisesse
testemunhar todos os dias
A verdade, a impossibilidade
O sonho, a zaragata,
A desilusão e a realidade
Seria livro para nunca mais
E um livro não é assim.
Um livro
É apenas literatura
Apontamento,
Saudade, memória
Delirio.
Refrescamento!
Se eu quisesse escrever
Teria primeiro que saber
Desenhar, pintar, moldar barro,
esculpir, perceber a natureza
E só depois me preocupar
Com a humanidade.
Daqui não resultaria nada
Mas, também não viria
Nenhum mal ao mundo
Sento-me
E fico à espera.
Espero por ti.
E por todos os que
Hão-de chegar.
Espero que aconteça
Espero que venhas
Conforme
A promessa
E o sonho antigo.
Espero que seja
presente, caricia,
mantra de embalar
Fio de azeite,
Beijo
Explosão nuclear.
Olho o céu
As nuvens
Sinto o vento
Agarro num punhado de estrelas
E espalho-as no firmamento.
Os olhos
Procuram outro olhar
Um sinal
Raio ou trovoada
Saber onde estás
Meu amor, minha esperança
Minha amada!
A espera é já caminho
Labareda fresca
Como nenhuma outra
Labareda inventada.
Celebro a espera
E a afirmação
Da aurora, do nascente
Da luz que me pega na mão
E guia pelo luar da vida.
No tempo mágico
Do caminho
Toda a inocência é consoada
Vem ouvir, amor,
Escuta, presta atenção!
São crianças a rir na madrugada.
ó homem de Deus
Tira esse cu do sofá.
Levanta-te
Vai dar uma volta ao mundo
Quando regressares
Eu ainda cá estou.
Foi então que um ofi
Desconfiado
Arrebitou as orelhas
Defendeu-se
Como pode e sabia
Emitindo roncos
Imprecações
Vitupérios
E os predadores
Afastaram-se.
O sol era magnanimo
A água fresca
o colmo e a sombra repousantes
A terra tinha paraisos
E havia muitas cobras por ali.
Em cada pedra um amigo
Em cada mulher uma saudade
Em cada casa um abrigo
Em cada tempo uma verdade!
Exponho-me
Não me exponho.
Escondo-me.
Mostro-me?
Fico ou não chego
A estar.
Quem me olha,
O que pensa?
Em que pensa
Como me vê?
Sou apenas uma tela
Em exposição.
Sou
O que me quiserem
Chamar!
Alguns
Sorriem
Outros choram
Poucos
Ficam indiferentes.
Uma tela
É um espelho
Do que nela se escreveu
Um reflexo
Do que nela se quer ver
Uma lágrima da alma
(seja isso o que for)
Uma chama, uma cor
Uma porta.
Visitei
A exposição
E não gostei.
Não me vi
Não me encontrei.
Expus-me
Morri
Nesse esgar fiquei.
E ficando
Fiquei.
"Ame-me, ame-me
Por tudo aquilo que eu não lhe darei"
António de Oliveira Salazar para Christine Garnier
Ninguém dá nada a ninguém
Por isso amem-me sem pedir algo em troca.
Quando estiverem fartos, desapareçam.
Cá ficarei, para contar a história.
O amor tem os dias contados
E eu conto os dias em que sou amado
Cada dia, amor, apaixonado!
Vinha-se acender comigo
E ia-se apagar com ela
(Frei António das Chagas -1631-1682)
Cito este acontecimento
Só por citar.
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