Pequenas opiniões sobre quase tudo que servirão para quase nada
Sexta-feira, 31 de Julho de 2020
Dança de espadas

E agora agosto

E as touradas (outra vez)

E o maldito calor

E a floresta em chamas

E tudo a morrer de tédio 

Porque nada muda

E este calor... 

É outra vez agosto

E as pernas das mulheres

Nuas de girassóis, 

Em agosto  as touradas

E as árvores a arder

E o turismo e isto tudo a rebentar

Num alleluia de tumor. 

 

O serviço terminou. 

Ide-vos.

Aqui, não fica ninguém. 

 

Todos somos culpados!

As portas fecham-se, 

Depois do cinema, 

Vamos comer frango à guia

Ou um gelado, quem sabe?

 

E agora?

-Agosto! 



carlos arinto maremoto às 02:19
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Quarta-feira, 29 de Julho de 2020
Escurece

Tudo fica escuro

E sujo 

Sem caminhos

Levadas ou veredas

Com árvores crescidas

Dejetos de animais

Escorraçados

Dos seus habitats 

Naturais.

Tudo fica escuro

Porque o tempo se fecha

E criamos sombras

Afogando os pés 

Numa lama mole

Que nos suga. 

O sol e a luz

Detém-se a alguns metros

De distancia

Por cima, em suspensão, 

Não poisando no novelo

Emaranhado e eriçado

De carbonizados restos

Onde, tudo um pouco

Se decompõe e fossiliza. 

 

Penso que tudo acabou. 

Sinto telúricos arrepios

Magmas de erupção 

Pelas pernas e coxas acima, 

Aranhas, gafanhotos, 

Pequeníssimos vermes... 

Desconheço se possuo

Tronco, cabeça, coração. 

Tudo escurece

E uma labareda de mar

Varre as minhas últimas emoções.

Fico. 

Tornei-me no tempo que não existe

No objecto que não se vê 

Na criação que foi destruída 

E no resíduo de mim mesmo. 

 

Ninguém me vira buscar

Salvar, resgatar, socorrer... 

Porque não há ninguém. 

Já não há ninguém.

Apenas um borbulhar

No escuro de um poço 

De que não se conhece

Fundo ou destino. 



carlos arinto maremoto às 09:32
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Terça-feira, 21 de Julho de 2020
Avec

Noite de trovoada

Relampagos, 

Barulhos, alguns pingos de chuva

Noite de avecs 

 

Eles andam aí, 

Sorrateiros

Ufanos

De retorno

De ribombar em ribombo

 Em estardalhaço, 

Volteio, sapateado,

Risomas javalizados

Crus e salgados

Tudo acompanhado

De passaritos saltitantes

 

Vou ali

Venho num instante. 

Avec! 

 



carlos arinto maremoto às 08:52
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Segunda-feira, 20 de Julho de 2020
Purilia

Não pode haver colapso depois de tudo desabado

Se já aconteceu, mais não há.

Então o que fazer?

Colapsar para cima, evaporar, implodir na inversa

-Sim, o mundo anda ao contrário.

É possível, tudo é possível, distópico e real

Ficam os cadáveres - enterrados ao longo dos anos,

Séculos, milénios - à mostra. Destapados.

Os mortos não evaporam, ressuscitam.

 

A festa vai começar. 



carlos arinto maremoto às 09:14
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Domingo, 19 de Julho de 2020
Abacate

O Abacate cresceu no cimo de uma arvore

Tornou-se grande, lizidiu e suculento

Está tão alto, lá no pincaro da ramagem

Que não tenho como ir busca-lo.

Nem escada nem voo de pássaro o podem resgatar

Está feliz longe de todas as mãos humanas

De todos os esfomeados e dos predadores 

Está escondido, confundindo-se com a folhagem

Quieto como um gato, envelhecendo com suavidade

O abacate será semente depois de todos desafiar

E não ser colhido. Então, descerá pelos seus meios

(tombando no chão de maduro)

E ali crescerão outros abacateiros e novos abacates

Depois que alguém, com carinho e ternura, 

O mude de lugar, pegando-lhe ao colo, 

Enraizando-o onde possa crescer até ao sol

E no alto, longe das rapina e das cestas de fruta

Que todos os dias vão para o mercado

Ser abacate, abacateiro, namorado, namoradeiro

 

 



carlos arinto maremoto às 11:28
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Sábado, 18 de Julho de 2020
Nu na praia

A praia, hoje, ao fim da tarde, está ventosa. 

É uma praia polvo. 

É uma praia que se agarra às rochas

É uma praia que se estilhaça, 

Que se deixa inundar de mar e tem caprichos de areias. 

Uma praia para nudistas. Uma praia nua.

 

 



carlos arinto maremoto às 18:31
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Sexta-feira, 17 de Julho de 2020
O senhor couve-flor

Do céu caíram pássaros estupidos

Que não sabiam voar

E bocados de avião paralisados no ar

Onde nunca deveriam ter subido

(nunca se vira nada assim,

Sempre os aviões vieram cair ao chão

Quando de repente se imobilizam no ar

Apanhados por "morte súbita"

Ou constipação passageira e da tripulação )

Caíram também bombeiros 

E naves amarelas que rebentavam águas 

Como se fossem parir barragens, 

Enormes cristos em chuva, em estilete

Que se transformavam em bisturis

Armadilhando o mar em pesca de arpão. 

 

Do céu tudo desabou. 

Flutuam penas de galinha após o extermínio, 

Exitantes em desafiar a gravidade 

Balançando sem sucesso em demonstrar vontade. 

Em aterrar e cumprir o destino. 

Cá em baixo. Lá em baixo. 

Os terrenos ficaram inundados de couve-flores.

 

Nunca houve outro milagre assim. 



carlos arinto maremoto às 19:36
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Quarta-feira, 15 de Julho de 2020
O funeral da festa das aldeias

Sem festa. 

Sem festas. 

Parecem gatinhos, 

Cordeiros, 

Cães amestrados, 

Burros

A virem comer à  mão.

Sem festa na aldeia. 

Sem emigrantes, 

Sem exibição. 

Sem mordomos

Nem donos. 

 

O funeral é agora

Agosto 2020

Faça -se a consagração.

Assine e mande publicar

Sem festas

O ano expirou.

 

O mordomo

(figura secular do poder)

Morreu. 



carlos arinto maremoto às 10:58
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Terça-feira, 14 de Julho de 2020
Vida. Adiada

Vivemos num futuro

Que nem sequer nos é próximo.

 

Vivemos para o ano, 

Ou depois, 

Quando for possivel

Talvez! 

Um dia destes, algures, 

Depois. 

 

O hoje não existe e o amanhã também não 

Ambos adiados, porrogados, esquecidos

Não interessa o que fazemos, hoje,

Sonhamos apenas com o depois

E vivemos no virtual do holograma.

 

Faz algum sentido, isto?

 

 



carlos arinto maremoto às 09:27
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Domingo, 12 de Julho de 2020
Petisqueira

Caracóis, 

Amêijoas, 

Lambujinhas, 

Berbigão, 

E rissois de camarão.

 

A cerveja pago eu. 

 

Um pires, de tremoços

Por favor.

Uns carapaus de escabeche

E torresmos. 

Guardanapos e uma amarguinha

Para finalizar. 

 

Nos tempos em que se limpava o balcao

De mármore, 

Com um trapo sujo e ninguém usava máscara. 

 

Vai um cheirinho? 



carlos arinto maremoto às 17:35
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Sábado, 11 de Julho de 2020
O calor

Sim, o calor

Aquela temperatura

Que ninguém aguenta

E derrete a pele

E faz o Inverno parecer

Uma coisa boa. 

Sim, o calor

E a praia, e o sol, 

E o tempo igual

E de volta a casa

O calor

E outra vez o sossego

Do calor que trava

O movimento

E deixa os corpos molhados. 

 

Corro a cortina

O calor morre na penumbra. 

 

 

 



carlos arinto maremoto às 08:15
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Sexta-feira, 10 de Julho de 2020
As férias na minha rua

A minha rua

Vai mar adentro

Salta ondas

Ou esperguicando-se

Com elas

Vem ter aos meus pés 

Que

Dormindo muma prancha

Baloiçam em rede

Entre duas gaivotas

Que sobem e descem

Ao ritmo da maré 

E das pequenas algas. 

Sao as minhas ferias de verão 

No sabor de agosto. 

 

A minha rua

É um barco parado

Espuma e silêncio 

Estrada antiga

Poiso velho

Sitio onde sempre estou

E vivo no sabor

De ser meu, este bocado

De mar. 



carlos arinto maremoto às 11:20
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Quarta-feira, 8 de Julho de 2020
As gaivotas, outra vez

Não trazem nada de novo

Barulhos, voos, sujidade das fezes

E volteios de imbecilidade

Não vejo o que isto tenha de interessante, 

De bonito ou de maravilhoso. 

Saracoteiam no ar indo e vindo, 

Planando, sem destino, anunciando água 

Que basta erguer os olhos para descobrir

O mar que lá está. Pousam e levantam

Discutindo sem competição a comida

O espaço, a reprodução 

Anunciando que existem, chamando

Ou afugentando como se estivessem sempre sós.

Mal a luz informa que é dia. 

 

Depois escondem-se, até que o sol se acoite

Só voltando a aparvalhar no final da tarde

As mais rebeldes grasnando todo o dia

Como se nunca se cansassem.

Insistindo sempre em anunciar a chegada

Do comboio e das redes de peixe fresco

Que aqui nada se aborrece. 

 

Gaivotas, outra vez.

 

 



carlos arinto maremoto às 06:33
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Terça-feira, 7 de Julho de 2020
Touros de morte

E num dia claro, 

Um touro passeia pela campina

Saboreando a madrugada

Longe de saber que não tem destino

Nem futuro, nem para onde ir

Quando o espaço onde vive acabar. 

 

Um touro, 

É um animal demasiado grande

Para sobreviver entre amibas

Crustáceos e formigas. 

 

Um touro limita - se a olhar.

 



carlos arinto maremoto às 11:52
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Segunda-feira, 6 de Julho de 2020
Dia na praia

Pode ser que o mar continue lá ao fundo

Pode ser que as ondas se aproximem e se desfaçam

Em branco, em espuma, em novelo, 

À beira dos meus pés

Embrulhando os nossos pés.

No areal coberto por um véu de água

Pequenos caranguejos, estrela do mar 

E estranhos líquenes que vão e vêm 

Com a maré, andam por ali solitários

Ocupados em construir o puzzle do universo.

Pode ser que tudo continue igual e azul

E em redor,cresçam árvores e arbustos verdes, 

Flores vermelhas, rosas e lírios, espontâneos lilases

E haja insetos e répteis e borboletas e gaivotas

E até … quem sabe ….

Pessoas continuem a povoar este planeta

Como se nada acontecesse de diferente

Estranho ou incomum, diferente ou inocente.

A humanidade está cheia de mitos

De lendas e de bichos que nunca existiram. 

 

Mundo feito de invisíveis coisas,

Outras, tão imensas …

Que nem se conseguem ver. 

Pode ser que a vida continue

E tudo sendo diferente, seja como sempre foi:

Igual, igual, igual, igual... 

Adamascado de sentires e sabores.

Coloridos perfumados. 

 

Passeio o corpo na praia enevoado de medos

E... enfeitado com sol, e os temperos do mar. 

Abrigo-me

Nos sorrisos que a penumbra oferece.

No sombreado de uma gaivota que passa

Numa fatia de escuro que a falésia projeta

Quando o sol lhe vergasta as costas.

 

O mar embala o amor só para mim.

Um imenso horizonte de velas e luas espreitam

Na infinita auréola que chega com o entardecer

Abro os braços e agradeço.

 

Hoje foi dia na praia. 

 



carlos arinto maremoto às 10:12
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Domingo, 5 de Julho de 2020
Triciclo

Sim, era um veículo da infancia

Com três rodas. 

Rodava à volta da mesa lá de casa

Enquanto durava uma música no radio

Depois era a vez do meu irmão. 

 

Nós crescemos e o triciclo lá ficou esquecido. 

Vieram as bicicletas, as vespas, as scooters, as motos, 

Os carros movidos a gasolina, gaz,  electicidade

As trotinete e os toboggans, os skates, os hoverboard

A inteligência artificial e o andarilho 

E nunca mais se falou no triciclo.

 

Adeus, ó meus amores, quem resta?

Uma Padiola erguida por servicais. 

Como sempre viajaram os senhores

Na Madeira, na Europa, no mundo

Numa rede, com varapaus levados em ombros... 

Até ao destino, das férias, do casamento, 

Do batizado e da procissão final. 

Que mais queremos? 

-um triciclo para pedalar! 

Atrevi-me a sugerir, com voz fraca. 

- talvez no próximo natal, ou quando fizeres anos. 

Ouvi a minha mãe responder. 

 

Morro em lágrimas 

E levo comigo esse triciclo da minha infância. 

 



carlos arinto maremoto às 11:09
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Sábado, 4 de Julho de 2020
Submerso

Zás. 

O cano da água rebentou. 

Vai um ribeiro pela rua

Levanta - se a calçada

Molha os pés quem ali passa.

Truz. 

Desabou! Abriu buraco

Ficou colina e cratera

Vísceras à mostra

Já existem reformados em redor

A comentar, a apreciar. 

Zlop!

Escorregou e caiu

Todo o cuidado é pouco

Passa o carro a acelerar

E a água espirra. 

Lama, pedras bolinhos quentes

Acabados de fazer

Na pastelaria em frente. 

Taruz!

Acabou-se o espetaculo

Chegaram os serviços para a reparação

Foram alertados por satelite

Um enorme buraco no chão 

Um mar de escolhos, peixes mortos 

Plásticos, lixo a entupir a canalização.

Só de preservativos foi uma camioneta carregada 

Comenta-se.

Garrafões, armários, até uma perna decepada. 

A normalidade foi reposta

Um mês inteiro de trabalho e a ferida curada

A água corre encanada, subterrânea, sossegada.

A superfície floresce um negócio de leitão assado. 

É para comer já? Ou leva embrulhado? 



carlos arinto maremoto às 08:33
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